sexta-feira, 12 de agosto de 2011


Do mesmo modo como no oráculo de Ifá, os signos geomânticos (Odù)são organizados dentro de um sistema classificatório; no culto a Osanyin, os vegetais, também, estão inseridos nesse sistema.

A relação folha/orixá se evidencia com a existência de quatro compartimentos estruturados a partir de uma concepção de categorias lógicas e ordenadas segundo a visão de mundo dos jêje - nagôs. Sendo os Òrìsàs representações vivas das forças que regem a natureza, as folhas a eles atribuídas, no contexto litúrgico, associam-se, conseqüentemente, a esses elementos. Barros (1993:60), estudando essas classificações, verificou que: "Os vegetais estão dispostos em quatro compartimentos-base diretamente relacionados aos quatro elementos; as ewé afééfé - folhas de ar ( vento); as ewé inón as ewé omi, - folha de água; e as Ilé ou ewé igbó - folhas da terra ou floresta.

"Nestes quatro compartimentos-base, concentram-se o panteão jêje - nagô . Genericamente, vamos encontrar Exu e Xangô participando do compartimento Fogo; Ogun, Oxossi, Ossain e Obaluaye ligados ao elemento Terra; Iemanjá, Oxum, Obá, Nanã e Yewá associadas as Águas, e Oxalá e Oyá ao Ar. Todavia, ao particularizarmos veremos que alguns Òrìsàs como Logunede e Oxumare, considerados "Meta-Meta", estarão vinculados a mais de um desses compartimentos.

Exu está ligado com predominância ao elemento Fogo, porém, como "cada Òrìsà possui seu Exu, com o qual ele constitui uma unidade" ( Santos, 1976:131), este compartilhará do mesmo elemento ao qual o Òrìsà está associado. Assim, os Exus das Iabás estarão ligados também , ao elemento Água, os de Ogun e Oxossi ao compartimento Terra, e assim ocorrendo com os demais Exus.

Ogun atua predominantemente com no compartimento Terra. Todavia, na qualidade Warin, encontramos um Ogun que habita nas águas , pois segundos os mitos ele vive no Rio com Oxum; conseqüentemente, estará, também, ligado ao compartimento Água. Já Ogun Àgbèdè Òrun, ( Ferreiro do céu), se liga, também, ao elemento Ar, juntamente com Oxalá.

Oxossi é ligado à Terra; mas, nas suas variáveis, encontramos Inlè, modalidade deste Òrìsà que, como Logunede, está associado tanto ao compartimento Água quanto ao Terra; entretanto, para maioria das outras qualidades de Oxossi predominam o elemento Terra.

Obaluaye, sendo um Òrìsà da Terra ( Oba = Rei, Aye = Terra ), mas que se relaciona com a febre e o sol do meio-dia, está ligado, igualmente, os compartimentos Terra e Fogo. Em algumas ocasiões ele recebe o título de : "Baba Igbonan = Pai da quentura" ( Santos 1976:78). Título que é dado também a uma qualidade de Xangô Airá, considerado dono do fogo e cultuado numa fogueira.

Ossaim, por ser patrono dos vegetais, automaticamente, está ligado a todos os elementos da natureza; todavia, seu compartimento principal é o Terra, representado pelas florestas onde nasceu todos os vegetais.

Oxumare é representado pelo arco-íris que se projeta nas águas em direção ao céu. Liga-se, simultaneamente, aos compartimentos água e ar. Pode ser irmão de Obaluaye, algumas vezes se relaciona, também , com o elemento Terra.

Nana, a iaba que é representada pela chuva fertilizando a terra (lama), tem como compartimento base a Água, mas, também, a Terra.

Oiá, em um de seus diversos aspectos, é cultuada no rio Níger, na África, o que realça suas características de "deusa da fertilidade" ligada ao compartimento Água, bem como á responsável pelos coriscos, tempestades e ventanias, fato que a associa tanto ao elemento Ar quanto ao elemento Fogo. Sob a denominação de "Oya Igbale, Orisá patrono dos mortos e dos ancestrais"(Santos 1976:58), participa, também do elemento Terra.

Xango está associado, predominantemente, ao elemento Fogo, enquanto que Iroko, entidade fitomórfica cultuada em uma árvore, embora possua muita afinidade com o primeiro, está ligado ao elemento Terra.

Oxum, Iemanjá e Oba são iabas ligadas, especificamente, ao elemento Água; porém, alguns de seus aspectos poderão ligá-las aos demais compartimentos base.

Oxalá esta ligado, com predominância, ao compartimento Ar. Todavia, Santos (1976:59) diz que "Oxalá está associado à Água e ao Ár, Odudua está associado à Água e a Terra". Assim como Odudua, Orixá Okó também é um Orixá funfun (original) e, segundo os mitos, é considerado o patrono da agricultura, possuindo estreita ligação com a Terra.

Nesta visão do mundo Jeje-nago, direito/masculino/positivo são opostos a esquerdo/feminino/negativo, ou seja, o masculino é positivo e se posiciona do lado direito, enquanto o feminino é negativo e se posiciona do lado esquerdo. Neste contexto os compartimentos que contêm as ewé inón (folhas do fogo) e ewé afééfé (folhas do ar) estão associadas ao masculino, elementos fecundantes, enquanto que as ewé omi (folhas da água) e as ewé ilè (folhas da terra) se ligam ao feminino, elementos fecundáveis.

Ao determinar que as folhas são separadas por pares opostos: gún (de excitação) x èrò (de calma), ewé apa otun (folhas da direita) x ewé apa osi (folhas da esquerda), os Jeje-nago tomam como modelo um sistema da classificação baseada em posições binárias. Todavia, essa não é uma condição sine qua non quando analisamos mais detalhadamente a utilização dos vegetais, pois percebemos que algumas folhas positivas se relacionam com o lado esquerdo ou feminino e vice-versa, daí encontrarmos folhas femininas usadas com fins positivos, e folhas masculinas consideradas negativas. Verger (1995:25) cita, por exemplo, "que entre as folhas há quatro conhecidas como (...) as quatro folhas masculinas ( por seu trabalho maléfico) ...; e quatro tidas como antídotos..."Entre estas últimas ele inclui o òdúndún (Kalanchoe crenata), que é uma folha feminina, porém positiva, o que nos faz crer que as diversas condições binárias não interagem de modo rígido entre si, pois, como vimos, uma folha masculina pode estar situada junto aos elementos da esquerda por ser considerada negativa.

No sistema de classificação dos vegetais, a condição para que uma folha seja masculina ou feminina é o seu formato, pois, na concepção Jeje-nago, a forma fálica (alongada) caracteriza o elemento masculino, em contrapartida, a forma uterina (arredondada) determina o elemento feminino. Essa convenção é adotada, tanto com relação as folhas, quanto aos jogos divinatórios que tiveram origem a partir do oráculo de Ifá, onde, dos dezesseis cauris usados, oito são de forma alongada e considerados masculinos, e os femininos são os oito restantes que possuem forma arredondada. "Por conseguinte, Macho/Fêmea formam um par de oposição básico no que se refere às espécies vegetais, e está diretamente relacionado ao Òrìsà" (Barros 1993:63). As folhas consideradas masculinas estão associadas aos oborós ( orixás masculinos), bem como as femininas pertencem às Iabas (orixás femininos); todavia, eventualmente encontraremos algumas folhas femininas associadas aos oborós e algumas masculinas atribuídas às iabas, o que parece refletir uma bipolaridade característica de alguns orixás.

Quando utilizamos nos rituais de iniciação ou nos trabalhos litúrgicos, os vegetais classificados como èrò tem a função de abrandar o transe, apaziguar o orixá ou acalmar o iniciado; contrariamente, os considerados gún servem para facilitar a possessão e excitar o orixá.

Dentro de sua complexidade, o sistema de classificação dos vegetais é coerente com a visão de ordenação do mundo; desse modo, os vegetais vão além de suas utilidades práticas, pois "estão diretamente relacionados a uma cosmovisão específica e são constituintes de um modelo que ordena a classifica o universo, definindo a posição do indivíduo na ordem cosmológica" Barros 1993:93).

Aqui estão alguns dos vegetais mais utilizados :



Abàfè = Pata de Vaca

Àbámodá = Folha da Fortuna

Àbàrà Òké = Baunilha de Nicuri

Ábèbè Kò = Tira Teima

Ábèbè Òsún = Erva Capitão

Abéré = Picão Preto

Ábitólá = Cambará

Àfòmón = Erva de Passarinho

Àgbá = Romanzeiro

Àgbàdó = Milho

Àgbaó = Imbaúba

Agbéye = Melão D'Água

Àgbon = Coqueiro

Àgogo = Figueira do Inferno

Àjóbi, Àjóbi Oilé, Àjóbi Pupá = Aroeira Comum, Aroeira Vermelha

Àjóbi Funfun = Aroeira Branca

Akan = Cará Moela

Akòko = Acoco

Jokonije = Jarrinha

Alékèsì = São Gonçalinho

Àlùbósà = Cebola

Àlúkerésé = Dama da Noite

Àlùmóm = Boldo Paulista

Àmù = Sete Sangrias

Apáòká = Jaqueira

Àrìdan = Aridan

Àrùsò = Alfazema do Brasil

Àsíkùtá e Efin = Malva Branca

Ata = Pimenta Malagueta

Ataare = Pimenta da Costa

Atopá Kun = Arruda

Àtòrìnà = Sabugueiro

Awùrépépé = Agrião do Para, Pimenta D'Água

Bàlá = Taioba

Balabá = Lirio do Brejo

Bánjókó = Bem me Quer

Bàrà = Melancia

Bejerekun = Pindaíba

Bujè = Jenipapeiro

Dandá = Junquinho

Dankó = Bambu

Efínfín = Alfavaca

Efínrín Kékéré = Manjericão da Folha Miúda, Manjericão

Ègé = Mandioca

Ègúsi = Melão

Èkèlegbara = Perpétua

Ekun = Sapê

Elégédé = Abóbora

Èpà = Amendoim

Eré Tuntún = Levante Miúda

Eró igbin = Erva de Bicho

Èsìsì = Urtiga da Folha Grande

Etába ou Asá = Tabaco, Fumo

Étipónlá = Erva Tostão

Ewé Bàbá = Boldo

Ewé Bíyemí = Quebra Pedra

Ewé Boyí = Bétis Cheiroso

Ewé Gbúre = Bredo

Ewé Idá Òrìsà = Espada de São Jorge

Ewé Inón = Folha Fogo

Ewé Isinisini = Mastruz

Ewé Iyá = Pariparoba

Ewé Kúkúndùnkú = Batata Docce

Ewé Lárà Funfun = Mamona

Ewé Lorogún = Abre Caminho

[ Ewé Òrìsà, Flavio Pessoa de Barros e Eduardo Napolião, Ed. Bertrand Brasil ]







"Ògbèri Nko Mo Màrìwò"

(O não iniciado não pode conhecer o mistério do Màrìwò)

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